Greve geral é o único direito que nos resta

Em nome de um fóssil de ideal liberal individualista, o moderno direito social coletivo do trabalho tem sido desconstruído e flexibilizado. Quando todo o conjunto de garantias fundamentais dos trabalhadores é posto em xeque, coloca-se em risco a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, que tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social. Se o Estado Democrático de Direito não é capaz de garantir um patamar mínimo civilizatório, o que esperar do negociado sobre o legislado? Salve-se quem puder!
O conflito entre capital e trabalho é muito mais antigo do as normas trabalhistas, que nada tem de revolucionárias, muito pelo contrário, funcionam como um lubrificante da máquina de exploração capitalista. Quando faltam direitos, a máquina pode parar, daí surgem as greves. Assim foi no início do século IXX, quando na Place de Greve, em Paris, às Margens do Rio Sena, os trabalhadores decidiram cruzar os braços contra a exploração do trabalho, e anos mais tarde, em 1º de maio de 1886, quando os trabalhadores norte americanos da cidade de Chicago se mobilizaram em uma greve geral que inspirou o dia internacional em defesa dos direitos trabalhistas.
Parece auspicioso que justamente às vésperas desta data simbólica do poder operário, seja aprovada uma reforma trabalhista que precariza suas condições de vida e degrada o meio ambiente do trabalho. Ora, dizer que aumentar a jornada de trabalho é sinônimo de liberdade, é subjugar a inteligência da classe trabalhadora que sabe bem o valor da sua hora de serviço, embora desconheça o conceito marxista de mais-valia. Despencamos de um patamar em que a bandeira dos sindicatos era a redução da jornada de trabalho para 40 horas semanais, o que garantiria a geração de milhares de novos empregos, para uma posição de resistência contra a conversão de horas extraordinárias em habituais, o fim dos intervalos intrajornadas e das horas in itinere.
Não se pode deixar de fazer a mea culpa em parte do movimento sindical, que nos últimos anos apostou na judicialização da luta de classes, e ao invés de mobilizações e greves, concentrou esforços em dissídios coletivos, o que em certa medida motivou o ativismo do Poder Judiciário em regulamentar questões trabalhistas com base na jurisprudência. Todavia, é importante ressaltar que o texto apresentado da Reforma Trabalhista, contesta a grande parte das interpretações jurisprudenciais consolidadas ao longo dos últimos 20 anos pelo TST, expressando a desarmonia entre o poder legislativo e judiciário. Caberá, todavia, ao Judiciário apreciar a inconstitucionalidade da reforma proposta, caso aprovada. Mas não se pode esperar muito da Suprema Corte em favor dos trabalhadores, tendo esta trilhado o caminho da desconstitucionalização dos direitos trabalhistas, inclusive do direito de greve dos servidores públicos.
Historicamente, a retirada de direitos nunca significou desenvolvimento econômico, ao contrário, a grande massa de consumidores é composta por trabalhadores, tendo sido justamente a ascensão da classe média proletária que alavancou o último ciclo de desenvolvimento econômico e social do país. Na verdade, a classe política, patrocinada pelas elites financeiras, sem qualquer amplo debate com a sociedade, se aproveita da crise econômica para implementar às pressas suas reivindicações, diga-se de passagem, muito mais ultrapassadas que a CLT. Até Adam Smith estranharia tais medidas, uma vez que segundo sua filosofia “o que melhora as circunstâncias da maior parte nunca pode ser considerado um inconveniente para o todo”.
As centrais sindicais estão convocando greve geral para o dia 28 de abril. Se o primeiro de abril serviu para reforçar as mentiras que estão sendo marcadas na história de nosso país, que essa data possa servir para resgatar a dignidade da classe trabalhadora e fazer valer a greve enquanto um direito legítimo e ao mesmo tempo enquanto fonte material de direitos trabalhistas. Greve geral!
Lucas Ribeiro Prado é bacharel em Direito.

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